segunda-feira, 7 de abril de 2008

O monólogo de Molly Bloom


O fluir da consciência que detinha Stephen Dedalus em suas decisões permite agora a Molly fazer um balanço de sua vida. Não é certo que o fluir da consciência tenha a forma de monólogo. Se todo discurso se edifica sobre outro discurso, em todo o discurso o diálogo se estabelece. Presente, passado e futuro se mesclam. A primeira lembrança que lhe vem à mente é a da manhã do dia que termina, o desjejum. O que foi visto na perspectiva diurna de Bloom é revisto na perspectiva noturna de Molly.
Embora Molly esteja continuamente preocupada com a sua existência corpórea, ela conceitualiza. Não recorda apenas os fatos, ela os comenta e, de alguma forma, procura ordená-los. Não o faz como o faria um pensador, e nisso ela contrasta Stephen. O jovem tenta compreender-se na vida individual e no universo, analisa Shakespeare para compreender-se.
Molly fica presa ao que experimentou. Podemos ver no monólogo dela a diferença de quem experimenta e daquele que pensa. Falta, por outro lado, a Molly o padrão metafísico que carateriza o monólogo da Justine do Marquês de Sade. Justine enlouquece porque ideologia e realidade não coincidem. Há um ingrediente quixotesco em sua personalidade. Justine perde a razão, Molly adormece. Stephen reorganiza: mata simbolicamente a mãe, e simbolicamente edifica a realidade sobre o filho (ele próprio) que tomou o lugar do pai. Verbalizar não é ainda pensar. Pensar é aviliar, encontrar um sistema de idéias que sustente o vivido. Molly revela sentimentos de mãe e de amante em relação ao marido e em relação a Stephen que espera conhecer melhor.
Donaldo Schüler

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